A noite de ontem foi uma merda!

Efeito colateral das minhas privações somadas a uma solidão crescente e avassaladora.
Sem tv, radio ou qualquer entretenimento que não meu livros este tipo de resultado era ate esperado.
A unica resposta viavel a tamanha adversidade é a escrita. Tem que ser ela. Seguir a trilha dos escritores etilicos boemios. Obras feitas em cima de mesas de bares a base de goles de observações.

Bar do Saopaulino, 0:30.

O pai vence.

-Cagada! Vocifera o filho ansiando a revanche.

Nova partida. Mais um gole de cerva. Na tv passa o seriado 24 horas, o qual assisti interessado apenas as 2 primeiras temporadas.
Do balcão, o dono do bar desfila seu cabedal de sabedoria popular sobre homens, mulheres e suas diferenças.

-Não vou perder mais nenhuma. Ouço o filho prometer.

É apaziguadora a presença dele. Afasta as lembranças ressentidas de como me afoguei.

Este bar. Que nunca se preocupou com a organização, hoje, supera seu proprio conceito de bagunça. Guimbas permeiam o chão, assim como esponjas, um abajur e um cachorro, dentre outros itens menos identificaveis.

-Seu merda! Alguem dispara no balcão. -Voce é um merda! Ai é que voce é um merda!

-Eu sou um merda. Afirma um bebado ao dono do bar. Repentinamente, ele bate palmas... e começa a dançar ao som da musica da jukebox.

A esperança vai vencer de novo.

Diz um pequeno adesivo colado na parede a minha frente e que agora percebo. Não gosto muito do slogan. Principalmente se levarmos em conta que ele se refere a uma candidata que perdeu a eleição.

A esperança vai perder de novo. É, assim ficaria mais apropriado.

-Tem uma moeda ai? Vamo ouvi aquela musica? Aaaaaaaaaaaaaaaaaah, meuuuu amoooooor... -Eu mereço, eu mereço, eu mereço...

Apos frases perdidas, como as de cima, a conversa no balcão ganha sentido. Falam de bebados loucos. Tais como um tal de Alemão. Capaz de xingar e brigar com amigos quando alterado. Meu proximo estagio, caso eu os tivesse nessa cidade ainda estranha.

-Povo da periferia não tem... a melhor musica. É rap.

O garoto coloca uma ficha na jukebox que despeja mais uma versão forro de musica americana, com direito a letra em portugues.
Inspirado, ganha uma partida do pai. A terceira ate o momento.

Peço mais uma cerva. Pedem mais uma pinga fiada, devidamente negada. O pedinte vai embora. Eu volto para a minha cadeira.
A distancia, ouço as queixas de uma mulher e suas duas filhas largadas na rua pelo marido.

-Voce jantou filho? Pergunta o pai atencioso.

1:30. Losed. Vontade de ir embora, fruto de cansaço e embriaguez aliados. Risadas invadem o recinto. Um homem tenta tirar a cueca do outro. Acho que estou bebado demais pra entender. As risadas continuam...

A filha mais nova não aguenta mais de sono no colo da mãe. Dorme e acorda seguidas vezes. Tenho pena dela. Indefesa diante das circunstancias. Que sera de seu futuro? A mãe beija a filha e diz a alguem perto:

-Eu só estou esperando a chave.

Uma barata cai em cima da minha mesa. Caralho! Dissgrama, a cronica. Jogo ela no chão e piso em cima, matando-a.

-Vambora! Diz a mãe as filhas.

Hora de ir ao water closet. Quando retorno, a mãe se foi.

Um cara entra no bar falando comigo tal qual fosse meu amigo. Outro puxa papo me confundindo com sei lá quem. Quanta solidão. 2:30.

Todos os pancados entram no bar de uma só vez. Disfarçando sua condição dentro de suas capacidades. O que inclui um cerva para aplacar o efeito visivel da cocaina.

-Sera que eu presto? Pergunta o agora nomeado bebum do bar a alguns pancados na entrada.

A indagação permanece sem resposta, indagação esta, que era a minha propria, de forma deturpada.

Sera que essa cronica presta?