DEUS EX-MAQUINA DE ESCREVER

O que vc faria, caso descobrisse que suas palavras datilografadas tornam-se realidade?

$, é claro. Vc pediria todo o $ ou apenas o sufuciente, certo?
Errado! Qq minima leitura de algum livro de auto-ajuda lhe dira:

-Não se deve nunca querer algo intensamente, pois esse sentimento acaba tornando o refem do desejo em si, o que impossibilita sua realização. Voce, e preste bem atenção nessa parte, deve de forma neutra e sincera, somente acreditar, sem apegos.

Ouve epocas nas quais, por causa dessa habilidade, temi a criação. Transcrevia exclusivamente diarios e memorias, tentado a sucumbir nas primeiras linhas de cada nova pagina.

Um acontecimento desse periodo foi emblematico a este respeito. Ele explica, de certo modo, o tom receoso que emprego agora e sempre.

No inicio de meu 'oficio' elaborei contos de pura violencia. Violencia essa que acabou por ocorrer a minha volta. Quase que da noite pro dia, apos o termino de um certo texto. Uma cena, a mais chocante contida nele, se materializou.
Gostei, apesar de assustado, que o acaso tenha atingido, identico nos minimos detalhes, uma pessoa que eu odiasse. Não pude, no entanto, conseguir evitar-me esta tetrica pergunta:

O que sentiria ao ver uma descrição de espancamento se materializar na pele de algum(a) amigo(a) meu/minha?

Evito sequer o pensamento da resposta e perambulo, ansiando parar TERMINANTEMENTE de trabalhar. Revejo minha meta pragmatica: 10.000 dolares ou reai$ liquidos = meta de 500 reais diarios. Ipad 4G na mochila, deitado na praia. Analisando em tempo real, vez ou outra, a cotação da bolsa.
Sera que é só isso? Acho que não. Vejo amigos que seguiram essa trilha e neles enxergo apenas escravos.
O. k. Certo. O que mais então? Ideias não faltam... Muitos, no meu lugar, se pudessem ver realizados os seus desejos pediriam amor. Mas isso eu já tenho. De tanto descreve-lo em detalhes, imerso numa continua solidão 'criativa' que permeou decadas, ela se superconcentrou na pessoa que hoje carrega o titulo de minha noiva.

A 'estoria' inicia aqui. No futuro-presente. Indeciso entre o relatar, o imaginar e o predizer.

Uma frase adiante, perco o fio do raciocinio. Recorro a memoria. Essa inimiga da abstração e da objetividade.
Lembro de uma vez no meu ultimo trabalho. Sentado no 'refeitorio' teorizando sobre os sonhos a partir do que sei de Freud. Ouviam-me em silencio monologar. Em silencio perpetuo. Esteril. Como fiquei irritado.
Para que saber? Que raiva saber. Essa prisão exclusiva para raros e loucos esquizofrenicos, né Hesse?
Outra memoria, outro lugar e tempo. Estou sentado na cama. Olho minha noiva e peço:

-Vamos correr pela rua?
-Estou doente. Quando eu melhorar nos vamos. Ela responde no resumo da opera.

Isto sou eu. Alimento do faminto papel em branco munido de impulsos, raiva e citações que evitam o mau lugar comum.
Razura apos razura edito e releio. Incluo adjetivos, altero paragrafos e elimino verbos.
Cada dia que eu leio é um dia a menos que escrevo. Shopenhauer diz num de seus livros que lemos devido ao nosso vazio. Concordo com suas meditações, mas acresentaria os pensamentos de Marco Aurelio aos dele. Esse vazio vem do fato de que não importa o valor do que digo, escrevo e leio, tudo sera esquecido. Assim como serão esquecidos as pessoas que leram meus textos e me ouviram comenta-los, incluindo suas opiniões sobre.